A história do Instituto de Aeronáutica e Espaço tem sua origem na década de 50, com a criação, em 1º de janeiro de 1954, do Instituto de Pesquisas e Desenvolvimento – IPD no campus do então Centro Técnico de Aeronáutica – CTA. O CTA nasceu de uma idéia visionária de Santos Dumont, há mais de meio século, que foi transformada em um plano simples, lógico e de longo prazo, conduzido com tenacidade e sob a liderança do então Tenente-Coronel Casimiro Montenegro Filho. Ao escrever sua obra “O que eu vi. O que nós veremos”, em 1918, Santos Dumont preconizava que, ao invés de enviar jovens ao exterior para estudar ciências aeronáuticas, o Brasil deveria criar sua própria escola, trazendo do exterior os especialistas necessários. Ainda de acordo com os escritos do patrono da aviação brasileira os alunos deveriam ficar alojados próximo à escola. Montenegro liderou um grupo de idealistas que acreditava ser possível dotar o Brasil de uma efetiva capacitação aeronáutica. Naquela época, esse era um desafio enorme, pois o Brasil era um país agrícola sem tradição industrial, que importava até mesmo as bicicletas que utilizava.
O fim da Segunda Guerra Mundial, com o consequente processo de reconstrução de uma nova ordem política e econômica mundial, atrelado ao idealismo de Montenegro e das autoridades aeronáuticas, sob o comando do Ministro da Aeronáutica Salgado Filho, criou a oportunidade de se atrair grandes pesquisadores do cenário internacional para o País. Foi então que, em novembro de 1945, após visita de Montenegro a Bases Aéreas Americanas e ao Massachussets Institute of Technology (MIT), foi criado o “Plano Smith”, assim chamado por ter sido concebido pelo Prof. Richard H. Smith, do Departamento de Engenharia Aeronáutica do MIT. O “Plano Smith” estabelecia a criação de um Centro Técnico que seria constituído por dois Institutos coordenados e tecnicamente autônomos – um para o ensino técnico superior e outro para pesquisa e cooperação com a indústria de construção aeronáutica, com a aviação militar e com a aviação comercial. Ainda segundo a concepção do Plano, quando nos laboratórios houvesse produtos com potencial de comercialização, seriam fundadas empresas. Estabelecida a escola de engenharia aeronáutica (o Instituto Tecnológico de Aeronáutica –ITA), não tardou para que fosse criada uma instituição capaz de transformar as teorias aprendidas no ITA em prática. Surgiu, então, em 1954, o Instituto de Pesquisas e Desenvolvimento - IPD, que já pôde contar com engenheiros formados no ITA.
O objetivo do IPD era a realização de pesquisas e desenvolvimento em aeronáutica, eletrônica, materiais, sistemas e equipamentos especiais para aviação. Foi no IPD que surgiu o projeto do avião Bandeirante que, em 1969, permitiu a criação da Embraer, do planador Urupema e do avião agrícola Ipanema.
Efetivou-se então, caso primeiro na história da indústria nacional, não só a transferência para a EMBRAER da tecnologia adquirida pelo IPD no desenvolvimento de projetos de aviões, como também a cessão de toda a sua equipe de técnicos, pessoal de administração e da quase totalidade do acervo da sua Divisão de Aeronaves e parcelas menores de outras Divisões do Instituto, dando à nova empresa imediata capacitação técnica e organizacional e permitindo que a mesma assumisse, de pronto, sua posição como organização produtiva e pudesse rapidamente tornar-se o centro de consolidação no desenvolvimento da indústria aeronáutica nacional.
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Outro feito magnífico do IPD foi o desenvolvimento do motor automotivo a álcool, solução brasileira para a crise do petróleo que se instaurava no País na década de 70.
Paralelamente aos avanços na área aeronáutica, o advento da corrida espacial, travada entre as superpotências do pós-guerra, fez com que a Sociedade Interplanetária Brasileira – SIB solicitasse ao Presidente da República, em 1961, a criação de um Conselho Nacional de Pesquisas e Desenvolvimento Espacial e, desta forma, em 03 de agosto daquele mesmo ano, foi criado o Grupo de Organização da Comissão Nacional de Atividades Espaciais - GOCNAE, subordinado ao Conselho Nacional de Pesquisas - CNPq, sendo a escolha natural para sua sede a cidade de São José dos Campos.
Nesse mesmo ano (1961), o Ministério da Aeronáutica, formalizou o seu interesse pela área espacial, visando o desenvolvimento de pequenos foguetes de sondagem meteorológica para a Força Aérea.
Em 1963, tentava-se, timidamente, desenvolver junto à indústria pequenos foguetes de sondagem denominados SOMFA, nome derivado de sondagem meteorológica para a Força Aérea. Esse projeto não prosperou e, ainda em 1963, objetivando concretizar a intenção da Aeronáutica de se dedicar às pesquisas espaciais, foi criado um grupo, vinculado ao Estado Maior da Aeronáutica (EMAER), que mais tarde, em 1966, tornar-se-ia no GETEPE - Grupo Executivo e de Trabalhos e Estudos de Projetos Especiais. Os trabalhos iniciais desse grupo foram dedicados ao planejamento de implantação do então Centro de Lançamento de Foguetes da Barreira do Inferno – CLFBI (atual CLBI), sediado próximo à cidade de Natal, no Rio Grande do Norte.
A partir de então, técnicos civis e militares da Aeronáutica receberam treinamento nos EUA, o que lhes permitiu o lançamento de foguetes americanos e canadenses a partir do recém-criado Centro de Lançamento. A inauguração do CLBI se deu em outubro de 1965, e o primeiro lançamento ocorreu em dezembro daquele ano, com o foguete americano Nike Apache. Foi também na época do GETEPE que, juntamente com a empresa Avibrás, foi desenvolvido o primeiro foguete de sondagem nacional, o Sonda I, cujo lançamento inaugural ocorreu em 1967.
Lançamento da Sonda I, em 1967
Em março de 1965, foi ativado o PAE (Departamento de Assuntos Especiais) no Instituto de Pesquisas e Desenvolvimento (IPD) do CTA com finalidades que abrangiam desde o desenvolvimento de foguetes à pesquisa e desenvolvimento de material bélico.
Ao atingir, em curto prazo, etapa relativa e substancialmente avançada no campo espacial, considerou-se o momento como oportuno e conveniente para realizar o seu desdobramento da organização do IPD. Assim, em 17 de outubro de 1969, foi dado início ao que seria o Instituto de Atividades Espaciais (IAE), cujo núcleo só foi ativado em 20 de agosto de 1971, constituído do pessoal e instalações do GETEPE e do Departamento de Assuntos Especiais do IPD. A portaria de criação do IAE extinguiu o GETEPE e passou o CLBI à subordinação do CTA.
Um grande feito do Instituto de Atividades Espaciais foi o desenvolvimento da família de foguetes de sondagem Sonda que permitiu ao País o domínio das tecnologias necessárias para o projeto de um Veículo Lançador de Satélites. Em 1970 ocorreu o primeiro lançamento bem sucedido do foguete de sondagem Sonda II. Em 1976 foi lançado o primeiro foguete Sonda III e em 1984, o primeiro foguete Sonda IV, todos eles desenvolvidos no IAE e lançados a partir da Barreira do Inferno. Em 1979 foi concebida a Missão Espacial Completa Brasileira (MECB), que objetivava a construção de satélites nacionais de coleta de dados e de sensoriamento remoto, lançados por veículos nacionais a partir do território brasileiro. O custo estimado, para a missão, na época, era de 900 milhões de dólares, com previsão de conclusão em 1989. Ao Instituto Nacional de Atividades Espaciais- INPE coube a construção dos satélites, enquanto a Aeronáutica ficou responsável pela construção do Veículo Lançador de Satélites (VLS), por meio do IAE, e pela construção do Centro de Lançamento de Alcântara - CLA, uma vez que o CLBI não comportava o lançamento de um foguete do porte de um VLS.
Os 30 anos decorridos entre o lançamento do Sonda I (1967) e do primeiro protótipo do VLS-1 (1997) revelam o extraordinário esforço conduzido pelo IAE no campo espacial. Enquanto o Sonda I possuía 3,90 m de comprimento, o VLS-1 possui 20 metros. A massa do Sonda I era de 54 kg, o que permitia alcançar a altitude de 70 km. O VLS-1 possui massa de 50.000 kg e alcance de 750 km de altitude atingindo a velocidade de 27.000 km/h. Em conjunto com o desenvolvimento espacial, foram também atribuídos ao Instituto de Atividades Espaciais, projetos na área de sistemas bélicos visando o desenvolvimento de armamento aéreo nacional para atender às necessidades da Força Aérea Brasileira. Desta forma, em 1976 foi criada no IAE, a Divisão de Sistemas Bélicos (ESB), atualmente denominada Divisão de Sistemas de Defesa (ASD).
Com o objetivo inicial de reduzir a dependência nacional do armamento aéreo importado, foram iniciados dois projetos: nacionalização das bombas de fins gerais e desenvolvimento de um míssil similar ao AIM9-B, em uso até então.
Os tempos dos pioneiros foram árduos, e a nacionalização não pode ser resumida a simples cópia: os processos de fabricação utilizados no exterior não eram adequados para uma produção em pequena escala no Brasil. Novas tecnologias tiveram que ser desenvolvidas, e ficou patente a necessidade de capacitação de recursos humanos. Em 1977 foi criado no Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), o Curso de Extensão em Engenharia de Armamento Aéreo (CEEAA), ministrado, desde então, em parceria com o IAE. A competência da ASD se consolidou e novos armamentos têm sido especificados e desenvolvidos com sucesso.
Em 1991, uma nova proposta de reorganização do CTA realizou a fusão do Instituto de Pesquisas e Desenvolvimento - IPD e do Instituto de Atividades Espaciais - IAE, criando-se, o atual Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), com a missão de “Realizar Pesquisa e Desenvolvimento no Campo Aeroespacial”. O objetivo da fusão foi aprimorar a utilização dos limitados recursos creditícios e humanos
A partir da criação do Instituto de Aeronáutica e Espaço as atividades aeronáuticas passaram a ter foco no desenvolvimento de sistemas de acesso ao espaço, de defesa, de materiais, no suporte à Força Aérea Brasileira frente às contratações e às indústrias aeroespacial e de defesa nacionais. Dentre os trabalhos de assessoria à FAB, destacam-se: elaboração de requisitos para diversos projetos de aeronaves, análises aerodinâmicas, ensaios em túnel de vento, análise de tolerância ao dano, bem como ensaios estáticos, de fadiga, de impacto, de trens de pouso e de compatibilidade eletromagnética, garantindo o voo seguro e o cumprimento da missão das aeronaves e dos sistemas de defesa da FAB.
Apesar das dificuldades, foi na década de 1990 que foram desenvolvidos os estudos que, em 2005, permitiram o início do Programa do Veículo Aéreo Não Tripulado (VANT) no IAE, contando com as participações do Exército Brasileiro, da Marinha do Brasil e de um representante industrial - a Avibras Aeroespacial S/A. A primeira fase do projeto foi concluída em 2010, quando foi dado início a segunda fase, denominada DPA-VANT (Decolagem e Pouso automático de VANT), que após todos os ensaios e qualificação, foi concluído em 2014.
Decolagem e Pouso automático de VANT em 2010
Há algumas décadas o IAE vinha dando atenção à área de turbinas a gás, capacitando uma equipe, realizando estudos e trabalhando no projeto e no desenvolvimento de turbomotores, tendo se tornado pioneiro em projetos e pesquisas nesta área no País. O projeto TAPP (Turbina Aeronáutica de Pequena Potência), desenvolvido com o ITA foi concluído em 2012, e a evolução nesta área ocorreu com os Projetos SPD (Sistema de Propulsão para Defesa) e TR5000 (Turborreator de 5000N), atualmente em pleno desenvolvimento no Instituto.
Turbina TR5000
Na área de Defesa, ao longo de mais de 30 anos, o IAE teve sua atuação dividida em três fases. A primeira fase constituiu-se em esforço de pesquisa e desenvolvimento para fabricar no país o armamento importado já utilizado pelas aeronaves de combate da Força Aérea Brasileira. Nessa fase, foram nacionalizados foguetes de aviação, suas cabeças-de-guerra e espoletas, bombas de exercício, bombas de fins gerais, espoletas para bombas de fins gerais, bombas incendiárias e suas espoletas. Assim, foi construída a base de capacitação que permitiu ao seu quadro técnico aprender e desenvolver, por meio de sistemas mais simples, os conhecimentos necessários para vencer os desafios futuros. A partir de 1985, iniciou-se a segunda fase, caracterizada pelo desenvolvimento de sistemas com maior complexidade tecnológica, aplicando-se soluções de engenharia de concepção própria. Foram desenvolvidas bombas lança-granadas, sistemas de freio aerodinâmico para bombas de fins gerais, bomba antipista, explosivos plásticos e componentes pirotécnicos para itens bélicos e veículos de acesso ao espaço.
Em 1994, com a retomada do projeto do míssil ar-ar (MAA-1) e posteriormente com o desenvolvimento do míssil antiradiação (MAR-1), iniciou-se uma nova fase, caracterizada pela maior participação da indústria nacional no desenvolvimento, e coube ao Instituto o acompanhamento técnico e fiscalização de contratos.
No período 2000-2018 foram desenvolvidos os projetos das bombas de penetração BPEN-500 e BPEN-1000, para emprego em aeronaves de caça, e o Sistema Trocano, para emprego em aeronave C-130.
O MAA-1B e o MAR-1, descontinuados, eram projetos com o desenvolvimento contratado junto à indústria nacional, com o IAE participando por meio de comissões técnicas e comissões de recebimento. O A-Darter é um projeto de um míssil ar-ar, de guiamento infravermelho, de 5ª geração, desenvolvido em parceria com a República da África do Sul, em que o Instituto participou enviando pessoal especializado do seu efetivo para atuar diretamente nos projetos dos diversos sistemas do míssil.
Na área de espaço, em novembro de 1997 ocorreu o lançamento do primeiro protótipo do VLS-1, que, apesar da falha de um dos propulsores do primeiro estágio, permitiu aos técnicos e engenheiros testarem e qualificarem em voo alguns dos seus subsistemas. Em dezembro de 1999, ocorreu o lançamento do segundo protótipo, que apresentou falha no propulsor do segundo estágio, mas que possibilitou a qualificação em voo de importantes subsistemas do Veículo Lançador de Satélites. A terceira tentativa de lançamento levou ao acidente em Alcântara, que vitimou 21 (vinte e um) técnicos e engenheiros na tarde do dia 22 de agosto de 2003. Este acidente é o fato mais triste da história do IAE. Para examiná-lo foi constituída uma comissão de investigação que contou com a participação da sociedade civil e de especialistas estrangeiros. As recomendações constantes do relatório de investigação balizaram diversas ações implementadas no IAE, incluindo: revisão das redes elétricas do VLS-1; adoção de normas mais rígidas de segurança na construção da nova torre móvel de integração e lançamento; implantação de melhorias no sistema de gestão da qualidade; elaboração de análise de riscos e reforço das atividades de segurança do trabalho.
Em função das sérias restrições orçamentárias e de pessoal, o plano de desenvolvimento do VLS-1, estabelecido pós-acidente de 2003, ficou defasado e exigiu adequações. Nesse processo, subsistemas críticos que já estavam fabricados tornaram-se obsoletos ou perderam o prazo de validade. Para complementar, as redes elétricas do VLS-1, contratadas junto a uma empresa do setor aeroespacial brasileiro, não passaram pelos testes ambientais realizados nos laboratórios do IAE, o que levou à interrupção do contrato. Diante desse contexto, o IAE, em comum acordo com a AEB e o DCTA, decidiu pela descontinuidade do Projeto VLS-1, o que ocorreu oficialmente no início de 2018. Uma vez tomada a decisão, optou-se, então, por focar no desenvolvimento de um Veículo Suborbital controlável (VS-50) e no Veículo Lançador de Microsatélites (VLM-1).
Simulação do VLM-1
Considerando que o nicho do mercado estava voltado para a utilização de microssatélites, cuja massa é da ordem de 100 kg e aproveitando todo o aprendizado, os conceitos e algumas das tecnologias demonstradas no projeto do VLS-1, o Instituto iniciou, desde 1998 os estudos para o desenvolvimento e certificação de uma configuração de um veículo lançador de microssatélites com menor custo e com apelo comercial: Esses estudos foram suspensos em 2003, em função da priorização do projeto VLS-1, e foram retomadas em 2009. Em 2011, a AEB e a Agência Espacial Alemã (DLR) assinaram uma carta de intenções para a pesquisa e o desenvolvimento conjunto do VLM-1. Em março de 2012, o VLM-1 passou a ser oficialmente um Projeto de Desenvolvimento Tecnológico no IAE e foi classificado como Estratégico pelo Estado-Maior da Aeronáutica (EMAER). Em 2014, o IAE e o DLR-Moraba estabeleceram a divisão de trabalho para o desenvolvimento conjunto do VLM-1, válido até hoje, e o IAE e a FUNCATE assinaram o Convênio 001/2014 para apoio administrativo e na gestão financeira do desenvolvimento dos subsistemas nacionais do VLM-1
Ainda no início da década de 2000, a pedido da DLR, o IAE desenvolveu um novo Veículo Suborbital denominado VSB-30. Seu primeiro voo de qualificação ocorreu em outubro de 2004, a partir do Centro de Lançamento de Alcântara – CLA. Desde então, 28 VSB-30 foram lançados, sendo 24 deles a partir da Europa, e os outros 4 a partir do CLA. Fornecer foguetes aos inventores dos foguetes da Era Moderna representa motivo de orgulho, não somente para o IAE, mas para todos os brasileiros que, direta ou indiretamente, participam desse esforço nacional. Este trabalho foi consagrado em 2009 com a primeira certificação de um produto espacial fabricado no país, qualificando-o a operar em diversas regiões do planeta.
Lançamento do VSB-30
A partir de 2016, alinhado com as diretrizes do Comando da Aeronáutica, o IAE deu início a um processo de reestruturação organizacional que, em 2018, resultou numa nova organização focada em projetos e serviços tecnológicos especializados de engenharia e de ensaios, com uma estrutura matricial.
Instalado em uma área superior a dois milhões de metros quadrados, dos quais mais de 50 mil possuem edificações, tais como salas, auditórios e bibliotecas, é principalmente sua infraestrutura laboratorial formada por mais de 60 laboratórios que dá suporte ao desenvolvimento, verificação e validação de seus projetos e atividades de aeronáutica, de acesso ao espaço e de defesa.
Novo Distintivo de Organização Militar do IAE